Um presente de grego no centenário do bondinho do Pão de Açúcar
Em se falando de Brasil, a tendência observada nos últimos anos em relação às concessões nas unidades de conservação é de quase privatização dos parques
Nas últimas semanas, a notícia da construção de tirolesas entre os morros do Pão de Açúcar e da Urca surpreendeu os cariocas, especialmente os moradores da região. As obras já começaram, e a empresa que administra o parque promete inaugurar a atração no segundo semestre.
A proposta vem acompanhada ainda de um segundo projeto, que está sendo chamado de “modernização” das estruturas já existentes no local, mas que na verdade aumenta em cerca de 50% a área construída no cume dos morros do Pão de Açúcar, da Urca e na base da Praia Vermelha. Em outras palavras, significa a derrubada de vegetação nativa e possível descaracterização deste que é um dos principais pontos turísticos não só do Rio como de todo o Brasil, reconhecido pelo Iphan e pela Unesco.
Nosso mandato já enviou um ofício ao Ministério do Meio Ambiente, ao Ministério do Turismo, à Secretaria Municipal de Meio Ambiente, à Secretaria Municipal de Turismo, à GeoRio, ao Iphan, à Embratur e ao Ministério Público do RJ, apresentando questionamentos e ponderações sobre os empreendimentos.
A obra da tirolesa foi aprovada pelo Iphan, que vistoria o local a cada quinze dias, segundo afirmou recentemente à imprensa. No entanto, é evidente que um projeto como esse deveria ser objeto de maior discussão, com participação de todas as partes interessadas. A empresa se defende dizendo que consultou sim a sociedade civil, mas a polêmica que foi gerada prova que o processo não foi suficiente.
A participação é uma forma de garantir a análise de um projeto por todos seus ângulos, para que se evite conflitos e impactos futuros e mesmo imprevistos em sua concepção.
Além da complexidade das obras na rocha, em um monumento geológico como o Morro do Pão de Açúcar, a área consiste em unidade de conservação (UC), o Monumento Natural dos Morros do Pão de Açúcar e da Urca, além de afetar – e ser afetada – por outras UCs como o Parque Natural Municipal Paisagem Carioca. A vocação da natureza não deveria se limitar a ser um empreendimento. Sua vocação é de só ser. E nos fazer ser.
Em se falando de Brasil, a tendência observada nos últimos anos em relação às concessões nas UCs é de quase privatização dos parques, algo que não pode ser ignorado. É evidente que precisamos de maior aporte de recursos na gestão das áreas protegidas e dos órgãos ambientais.
Um caminho para promover a visitação às áreas naturais de forma sustentável e integrada, junto à manutenção das comunidades locais e dos saberes tradicionais, é a promoção do ecoturismo de base comunitária. O turismo de base comunitária é uma alternativa na qual acreditamos e que deve ser levada em consideração na formulação das parcerias público-privadas para que possam ser também público-comunitárias.
É evidente que precisamos dar suporte ao turismo de massa que aqui chega, sobretudo na nossa cidade cartão-postal, mas é importante lembrar que nem tudo é sobre o grande turismo ou o mega empreendimento. Também pode ser sobre o pequeno, o comunitário, o simples (que no geral, aliás, gera mais e melhores empregos). Não precisamos, por exemplo, de mais um resort em Boipeba! Precisamos que todos possam ter acesso à natureza, da qual fazemos parte.
Como já disse Manoel de Barros, avião vira sucata, mas não vi nenhuma coisa mais bonita na cidade do que um passarinho. Seguiremos em luta!
Chico Alencar é professor de História, mestre e doutorando em Educação e tem 35 livros publicados. Em 2022 foi eleito para seu quinto mandato como deputado federal, graças ao voto de 115.023 eleitores e eleitoras.
Olá! Não estão mesmo preocupados com nada, apenas vender barato patrimônio público para que interesses privados façam o que querem e lucrem… alguma coisa o poder público (ou seus agentes) deve ganhar ao aceitar esse negócio tão ruim para o público e a natureza (da qual faz parte). Obrigado!