Uma vassourada de cidadania
Não violenta, e organizada por jovens, a associação Le Balai Citoyen [A vassoura cidadã] incita os habitantes de Burkina Faso a se engajarem. Em outubro de 2014, o coletivo desempenhou um papel decisivo nas manifestações que culminaram na deposição do presidente Blaise CompaoréDavid Commeillas
É muito fácil brincar de rebelde nos clipes e ao mesmo tempo não se arriscar quando se apresenta concretamente a ocasião de melhorar a situação do país”, martela o rapper Serge Bambara, conhecido como Smockey. “Não temos outra escolha senão nos envolver, porque essas pessoas são o público que nos pediu que falássemos em seu nome.” Se esse músico de 43 anos, autor de vários hits que denunciam a corrupção política na África,1 se expressa na primeira pessoa do plural, é porque ele não está só. Na companhia do cantor de reggae Sams’K Le Jah, ele fundou a associação Le Balai Citoyen [A vassoura cidadã] em 2013. Esse coletivo desempenhou papel essencial nas manifestações que culminaram na deposição do presidente de Burkina Faso, Blaise Compaoré, em 31 de outubro de 2014, após 27 anos de reinado.2
“Nosso número é a nossa força” é um dos slogans mais conhecidos da organização. Se por um lado é impossível contabilizar precisamente seus membros, de outro se sabe que a Le Balai Citoyen contabiliza sessenta núcleos na capital, Uagadugu, e cerca de quarenta outros instalados por todo o território nacional. Um núcleo deve ter pelo menos dez inscritos para ser listado como cibal, contração de citoyens balayeurs (cidadãos varredores). Eleita por uma assembleia geral anual, a coordenação nacional tem treze membros, entre os quais estudantes, comerciantes, três músicos, dois jornalistas e um advogado.
Constituída para lutar contra o abuso de poder de Compaoré, a Le Balai Citoyen estabeleceu seu estatuto em junho de 2013. O advogado Guy Hervé Kam, de 43 anos, o redigiu. Esse ex-magistrado é bem conhecido dos círculos militantes porque, como dirigente do Centro para a Ética Judiciária (CEJ), lançou uma petição destinada a tornar inatacável o famoso artigo 37 da Constituição, que limita a dois o número de mandatos presidenciais. Sua presença ao lado dos músicos reforça o crédito da associação. Além disso, suas competências de negociador se revelaram preciosas após a queda de Compaoré, quando a Le Balai Citoyen acabou assumindo o papel de mediadora entre os militares (muito influentes nos círculos do poder), a oposição política e a população.
No final de outubro, após vários dias de revoltas populares, o país se viu à beira do caos. “Pedimos aos militares que designassem um interlocutor único, capaz de assegurar a transição aberta pela deposição do presidente. A partir do momento em que houvesse unanimidade entre eles em relação a essa pessoa, iríamos nos empenhar em apoiá-la para assegurar a estabilidade do país; o mais importante para nós era a segurança das pessoas e dos bens”, conta Kam. Os militares designaram o general Yacouba Isaac Zida, que tinha sido companheiro de armas do ex-presidente. “Exigimos então que ele não tomasse nenhuma decisão sem a concordância dos partidos políticos e das associações. Queríamos que todos se sentassem à mesma mesa para organizar a transição, mas os partidos políticos se recusaram.” Várias formações organizaram as mesmas marchas nas ruas, em 2 de novembro, aumentando a confusão. Ocorreram enfrentamentos, e tiros foram ouvidos na capital, fazendo dois mortos entre os civis. Finalmente, chegou-se a um compromisso: um civil, ex-diplomata e ministro do Interior, Michel Kafando, assumiu a direção temporária do país com o título de presidente interino, enquanto o general Zida tornava-se primeiro-ministro.
Nesse clima explosivo, a Le Balai Citoyen tenta desempenhar um papel de sentinela, velando pelo bom funcionamento da transição e pela probidade dos ministros. Em janeiro, por exemplo, o coletivo empreendeu uma campanha e conseguiu a demissão do ministro dos Transportes, Moumouni Dieguimdé, acusado pelo semanário Le Reporter de atribuir a si mesmo diplomas imaginários e esconder uma condenação a quatro meses de prisão nos Estados Unidos por falsificação. “Queremos líderes com uma ética irrepreensível”, insiste Smockey.
Sams’K e Smockey já receberam pedidos de apoio e orientação vindos do Níger e do Gabão, onde movimentos mais ou menos calcados no deles querem se constituir. “É muito importante apoiá-los”, sublinha o rapper. “Quando a Le Balai foi montada, as pessoas compreenderam imediatamente aquilo que se queria fazer porque elas conheciam o movimento Y en a Marre, do Senegal, e isso nos ajudou.” A Le Balai Citoyen agora faz parte de uma plataforma continental chamada Tournons la Page (Viremos a página),3 que luta pela alternância e pela democracia na África. “No Togo, jovens chegaram a criar uma Balai Citoyen sem nem mesmo nos comunicar”, alegra-se Smockey. “Não podemos dar apoio sem saber do que se trata, é claro, mas queremos realmente encorajar as iniciativas de pessoas que não provêm dos meios políticos e agem de maneira completamente espontânea.”
A Le Balai Citoyen de Burkina Faso enfrenta as dificuldades próprias de um movimento que cresceu muito rapidamente: desfruta uma forte notoriedade na África, enquanto permanece muito frágil no âmbito nacional; divergências de opiniões sobre os métodos a empregar e o caminho a seguir atrasam seu progresso. Alexandre Diakité, responsável pelo núcleo de Bobo-Dioulasso, a segunda cidade do país, foi suspenso porque se apresentou como candidato a funções no Conselho Nacional de Transição (CNT) sem o aval do movimento. A questão do envolvimento político dos líderes do coletivo é: devem-se aceitar eventuais propostas de cargos governamentais? “Eu penso que seria um erro”, estima Kam. “Isso iria nos desacreditar e tornar confusa nossa mensagem, e devemos empregar nosso tempo para justificar nossa atividade, a fim de manter nosso capital de simpatia. Foi porque não estávamos no governo que pudemos criticar certas indicações, e é porque não somos remunerados pelo Estado que podemos denunciar os salários exorbitantes dos membros do CNT.”
O desafio dos cidadãos varredores agora é trabalhar pela organização de uma eleição presidencial democrática e transparente. Isso inclui incitar os milhões de pessoas que se dispuseram em outubro e novembro a se inscrever nas listas eleitorais. As providências administrativas necessárias desagradam à maioria da população de 17 milhões de habitantes, dos quais apenas 28% são alfabetizados.4 Em seguida, a Le Balai Citoyen quer tratar do papel dos chefes religiosos e de costumes. Na cultura mossi do planalto central, os representantes das autoridades tradicionais exercem com frequência uma influência determinante no resultado da eleição.5 O ex-presidente compreendeu muito bem isso: depois de ter encorajado alguns deles a ocupar um lugar na Assembleia Nacional, ele pensou, em 2011, em lhes oferecer salários e status para assegurar seu apoio definitivo. A Le Balai Citoyen queria, ao contrário, reduzir sua influência, proibindo-os, por exemplo, de receber presentes de líderes públicos. Enfim, a associação deve velar para que Compaoré, refugiado na Costa do Marfim, não consiga instalar um de seus parentes no poder na eleição presidencial de outubro de 2015. “Burkina Faso não tem os meios de constituir um governo afastando sistematicamente todos os que trabalharam com ele”, admite Kam, de forma realista.
Os cidadãos varredores sabem muito bem que um regime que perdurou por 27 anos não pode ser desconstruído em alguns meses, mas continuam a trabalhar para virar a página do antigo regime e evitar que o cargo de presidente vá de novo para um militar.
David Commeillas é jornalista.