A cultura sobrevive!
Em seu difícil cotidiano como produtores culturais, artistas buscam programas de incentivo, novas formas de qualificação, valorização e reconhecimento de seu trabalho
Ser artista no Brasil raramente é uma escolha. Na maioria das vezes é uma vocação. Mesmo com todas as dificuldades que o meio cultural enfrenta, os artistas persistem. Ensaiam dia e noite, dão aula no dia seguinte, se aventuram na iluminação, escrevem, dirigem espetáculos. Apresentam-se no palco, nas salas, nas ruas. Onde houver público.
Se depois de ler isso você pensa que o artista é um super-herói, não se iluda, porque não é e nem deve tentar ser. Todos querem ser reconhecidos como profissionais como qualquer um. Querem se sustentar, se renovar, ter voz, aprender e apreender as mudanças que o tempo traz. Afinal, segundo o escritor contemporâneo Josué Cândido da Silva (2007), “o artista precisa mergulhar em seu tempo, não pode ficar preso às formas do passado […] precisa experimentar novas formas que melhor traduzam a sensibilidade de seu tempo.”
E para isso não basta apenas força de vontade, ainda mais em um tempo em que a cultura anseia por valor. É preciso haver programas de incentivo, campanhas de valorização da cultura, projetos que possibilitem a democratização da arte e maneiras viáveis para que os profissionais da área possam se qualificar. Por trás de um grande espetáculo ou um evento bem sucedido sempre há uma trajetória de luta diária.
É o caso da fotógrafa Juliana Hilal, de Campinas (SP). Além de trabalhar com fotografia de palco, ela também é bailarina e diretora de teatro. Migra entre espetáculos, eventos, ensaios, reuniões. Pega equipamento, descarrega equipamento, fica até tarde no espetáculo, e por aí vai. Mesmo assim, muitos ainda não reconhecem o seu trabalho como um trabalho. “Trabalhar com arte não é visto pela maior parte dos brasileiros como uma profissão. Não é raro ouvir de amigos e familiares: “legal você fazer teatro, mas quando você vai arrumar um emprego de verdade?”, conta a fotógrafa.

Segundo ela, os brasileiros também não consomem tanta cultura como poderiam e deveriam. “Por questões escolares e familiares, o público leigo não tem por hábito frequentar espetáculos ou exposições, e a aquisição de ingressos não é vista como um investimento na formação do cidadão, mas sim como um gasto desnecessário”, continua.
A forma que ela e outros artistas têm encontrado para alcançar um pouco mais de reconhecimento é não se acomodar e buscar sempre uma forma de qualificação. Mas é claro que nem sempre é possível conciliar uma formação mais longa sem deixar o trabalho um pouco de lado. Por isso, a artista encontrou em cursos que intercala entre um trabalho e outro, uma alternativa para se qualificar. “Eu acho que é fundamental para os artistas, para os profissionais estarem sempre se renovando, reciclando, absorvendo conhecimento, aprendendo”, explica.
Nesta semana, ela escolheu fazer oficinas de direção cênica e iluminação cênica oferecidas pela Fundação Nacional de Artes (Funarte) em Campinas. A Funarte tem um projeto de capacitação técnica que oferece oficinas gratuitas no país todo nas áreas de música, artes visuais e artes cênicas. Além de Campinas, as próximas cidades a receberem os cursos são Belém (PA), Fortaleza (CE) e Rio de Janeiro (RJ).
Segundo uma das diretoras responsáveis pelo projeto, Maristela Rangel, não só os alunos aprendem com esses cursos, mas os próprios oficineiros, que vêm de diversos cantos do país e até de fora.
“Tanto os artistas locais quanto a Funarte se capacitam nesse programa. Os oficineiros são profissionais de grande experiência, mas a diversidade cultural do nosso país faz com que cada um entenda a cultura do local onde ele está. A criação do Sul é diferente do Sudeste, que é diferente do Norte e do Nordeste. Esses artistas ensinam aos oficineiros como eles querem se enxergar dentro da teoria das artes. Sem dúvida trata-se de uma grande troca de conhecimentos”, pontua.
Para Juliana, é essa troca que torna a arte um atraente desafio para os profissionais. “Um grupo muito eclético, pessoas com bagagens diferentes, formações muito diferentes também, e aí tudo isso misturado. É incrível porque a gente traz muito do que a gente é, do que a gente já viveu. Cada um cria um trabalho completamente diferente do outro. É muito bacana de ver a contribuição de cada um para o trabalho e a riqueza dessa mistura”, conclui. A luta pela valorização cultural no Brasil continua. Mas iniciativas como essa, que permitem o aprendizado e a troca constante entre artistas, mostram que a cultura está, sim, viva e pode dar passos cada vez maiores.
Clara Rios é jornalista