O encerramento das eleições é o desfecho do conflito político mais acirrado da história recente. O eleitor optou pelo programa político do candidato vencedor, mas, no meio desse fogo cruzado ideológico, alguns temas ainda parecem um tanto quanto misteriosos. O tal orçamento secreto é um deles, motivo pelo qual, entre fatos e versões, é necessário desnudá-lo.
É na Lei orçamentária anual que se estipulam as despensas e receitas do ano seguinte. Inúmeras despesas são obrigatoriamente incluídas, como é o caso dos gastos com saúde e educação, pagamento do funcionalismo, aposentadorias, dívidas, dentre outros. Ocorre que sempre há alguma parcela que não são obrigatórias, nem por Lei, e nem pela Constituição Federal, permitindo ao Poder Executivo implementar suas políticas públicas, programas e gastos que preferirem.
No caso brasileiro, da peculiar relação entre o Poder Executivo e o Legislativo, nasceram as chamadas “emendas parlamentares”, isto é, da proposta elaborada pelo Poder Executivo, há uma margem para que deputados e senadores indiquem os gastos que querem.
Esses gastos que deputados e senadores indicam geralmente são investimentos ou melhoramentos nas regiões que os elegeram, podendo consistir em hospitais, pontes, ou outros gastos, efetuadas por meios de repasse aos municípios ou região respectiva.
Em algumas oportunidades há suspeitas, ou até mesmo condenações, por superfaturamento, ou outros ilícitos, em tais gastos. Assim, para inibir eventuais irregularidades, é informado, publicamente, qual foi o congressista que elaborou a emenda, qual será o gasto e onde será realizado.

O tal orçamento secreto foi uma tentativa de impedir que se saiba quem fez a emenda. Denominada de “emenda do relator”, os gastos indicados por deputados e senadores são incluídos diretamente pelo relator da Lei orçamentária, sem indicar quem o elaborou – daí a denominação “orçamento secreto”.
O fato é que essa misteriosa figura, criada pela Lei 13.957/19 e sancionada pelo atual Presidente da República, viola a transparência do orçamento público e certamente não foi bem recebida pela sociedade.
No final de 2021, a Ministra do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber, julgando a medida cautela na ADPF 854, decidiu que é “incompatível com a forma republicana e o regime democrático de governo práticas que promovam segredo injustificado”, exigindo que as tais “emendas do relator” sejam identificadas com clareza”. A mesma marcou o julgamento final dessa ação para o dia 7 de dezembro.
É curioso notar um outro mistério. Alguns partidos que levantam a bandeira liberal, defendem o Estado mínimo, o controle de gastos e o combate à corrupção votaram, sem qualquer constrangimento, favoravelmente à criação do orçamento secreto.
A melhor forma de combate à corrupção não é o discurso, tampouco o marketing pessoal, mas a prática de ações políticas que as inibam, onde se destacam a publicidade dos atos e a fiscalização de qualquer gasto público.
Luís Frederico Balsalobre Pinto é mestre em Direito Penal (PUC/SP).