Desigualdade e capitalismo: a urgência de um estado anticapital e pró-social
Para romper com o ciclo de desigualdades, precisamos de um Estado que desafie a lógica capitalista
Com a eleição em alta, sempre surgem debates sobre desigualdade, saúde, segurança, trabalho, moradia, entre outros. Esses assuntos ganham destaque nas redes sociais e nos noticiários, mas muitas das propostas como “soluções sociais” na verdade escondem um viés neoliberal. No fundo, elas mantêm um sistema que favorece o lucro e os grandes detentores de poder econômico, sem mexer nas estruturas que realmente importam.
Conforme estabelecido no Art. 6º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, são considerados direitos sociais: “a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 90, de 2015). No entanto, as políticas neoliberais adotadas nas últimas décadas têm criado um abismo entre o que está na lei e o que acontece na prática. Grupos vulneráveis, principalmente a classe baixa, são os mais afetados por essas medidas, que enfraquecem a efetivação dos direitos básicos.
Neoliberalismo: uma ideologia além da economia
O neoliberalismo não é apenas um conjunto de políticas econômicas, mas uma lógica que permeia todas as esferas da sociedade. Rahel Jaeggi (2020) aponta que o neoliberalismo transforma a relação entre o político e o econômico, colocando o mercado como prioridade. A jornalista Katrine Marçal (2022) complementa essa visão, destacando como até as políticas familiares e criminais são usadas para manter os interesses de quem detém maior capital econômico. Isso mostra que, em vez de servir o povo, o Estado acaba reforçando a lógica do capital.
Capitalismo e a consolidação da desigualdade
O sociólogo norte-americano Erik Olin Wright (2019) descreve o capitalismo como um sistema no qual a distribuição de recursos é controlada pelo poder econômico. Ou seja, a lógica é de maximizar lucros e acumular riqueza, gerando desigualdades sociais profundas. Cabe ainda ressaltar que embora o sistema capitalista tenha proporcionado avanços em termos de produtividade e enriquecido parte da sociedade, a maioria da população ainda luta por sua sobrevivência, diante da exclusão que o capitalismo impõe aos mais pobres.
Além de perpetuar formas de sofrimento que poderiam ser evitadas. O capitalismo estimula a divisão de classes, enquanto uma pequena elite detém a riqueza econômica, a maioria das pessoas, especialmente a classe baixa, enfrenta enormes dificuldades para garantir suas necessidades e direitos básicos. Tiago Muniz Cavalcanti (2021) descreve essa estrutura social em Sub-humanos: o capitalismo e a metamorfose da escravidão, explicando como a elite se apropria da maior parte da riqueza, deixando o restante com pouco ou nada.
Ademais, nessa linha, é importante destacar o entendimento do advogado e sociólogo Jessé Souza (2019), sobre a posição da classe baixa ou “subclasse”, na sociedade. Para ele, a classe baixa é tolerada apenas por realizar atividades que a classe média rejeita. Isso gera um ciclo de culpa, que faz com que os indivíduos dessa classe acabem se vendo como responsáveis pelo próprio “fracasso”. Sem perceberem que o sistema foi feito para beneficiar os mais privilegiados.
Para romper com esse ciclo de desigualdades, precisamos de um Estado que desafie a lógica capitalista. Um Estado anticapitalista deve colocar os direitos sociais no centro, garantindo que a riqueza pelo trabalho seja distribuída de forma justa e que as políticas públicas reduzam, de fato, as desigualdades.
Esse Estado precisa parar de atuar como agente dos interesses privados e começar a proteger aqueles que não têm sua dignidade e seus direitos devidamente garantidos. É urgente um Estado que coloque o bem-estar das pessoas acima do lucro de poucos.
O futuro de uma sociedade mais justa passa pela construção de um Estado que combata as forças do capital e promova a redistribuição de riqueza e poder, colocando o social à frente dos interesses de uma minoria abastada.
Ademais, a construção de um Estado mais social depende de um esforço coletivo e crítico, capaz de desafiar as estruturas que historicamente mantêm uma minoria privilegiada à custa do sofrimento da maioria.
Diogo Almeida Camargos é formado em Gestão Financeira pelo Centro Universitário Una, certificado em CPC-P, especialista em Direito Penal Empresarial e em Direito Penal Econômico pelo Centro Universitário União das Américas, Master in Business em Governança, Risco e Controles e especialista em Direito Empresarial pela Faculdade Cedin.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2023]. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm#:~:text=Art.%206%C2%BA%20S%C3%A3o%20direitos%20sociais,desamparados%2C%20na%20forma%20desta%20Constitui%C3%A7%C3%A3o. Acesso em: 04 ago. 2024.
CAVALCANTI, Tiago Muniz. Sub-humanos: o capitalismo e a metamorfose da escravidão. 1 ed. São Paulo. Boitempo, 2021.p.82.
FRASER, Nancy. JAEGGI Rahel. Capitalismo em debate: uma conversa na teoria crítica. Tradução de Nathalie Bressiani. 1 ed. São Paulo. Boitempo, 2020.
MARÇAL, Katrine. O lado invisível da economia: Uma visão feminista do capitalismo. Tradução de Laura Folgueira. 2 ed. São Paulo, Alaúde Editorial, 2022.
SOUZA, Jessé. A construção social da subcidadania: uma leitura alternativa do Brasil moderno. 1 ed. Rio de Janeiro. Estação Brasil, 2023.
WRIGHT, Erik Olin. Como ser anticapitalista no século XXI?. Tradução de Fernando Cauduro Pureza. 1 ed. São Paulo. Boitempo, 2019.