Por uma gestão de cidades inteligentes voltada à solidariedade
De formas distintas, cidades do leste-fluminense buscam políticas de inovação em matérias populares
A gestão de políticas públicas para cidades inteligentes deve passar por um planejamento estratégico em prol da solidariedade. No caso específico das cidades do Leste do Rio de Janeiro, como Maricá, Saquarema e Niterói, os recebimentos de royalties do petróleo são acompanhados de uma opção política pela diversificação do papel da cidade aos seus habitantes, partindo, cada vez mais, na direção de uma prestação garantidora de direitos. Nesse sentido, se fortifica o uso da ciência de gestão pública para a constituição de projetos inovadores com benefício popular imediato.
Em confronto aos problemas urbanos, um modelo público de desenvolvimento
Partindo da premissa de que as soluções públicas se encontram no dia a dia das cidades, tais municípios têm empregado uma estratégia de desenvolvimento integrada. Envoltas a um modelo público de desenvolvimento, consolidam uma visão que prioriza não apenas o desenvolvimento da infraestrutura da cidade, mas também a qualidade de vida dos cidadãos e a sustentabilidade ambiental. Maricá pode ser o exemplo mais emblemático de inovação social em matéria de políticas públicas: a cidade não só criou a moeda social Mumbuca, destinada a circular dentro do município e dirimir seu antigo papel de cidade-dormitório, como também consolidou o programa em uma renda básica para a cidadania. Saquarema e Niterói seguiram a mesma linha, lançando a moeda social Saqua e Arariboia, respectivamente.
O exemplo de Maricá com a Empresa Pública de Transportes ilustra ainda mais essa sistemática: ancorada em quatro distritos separados entre si, a cidade utiliza os “Vermelhinhos e Vermelhinhas”, ônibus e bicicletas públicas da cidade, para possibilitar a mobilidade urbana diária dos moradores e efetivar o direito previsto constitucionalmente. Ademais, enquanto Saquarema ratifica sua tradição global com o Surf, as soluções culturais das cidades irmãs passam pelas avenidas: pertencente à tradição do samba, Viradouro se consolida no cenário das campeãs do maior carnaval do mundo com o apoio público de Niterói. Promissora e originada de um ímpeto social, a União de Maricá potencializa o orgulho da cidade e estreará na Sapucaí no próximo carnaval.

Tais eventos também ressignificam o próprio significado das cidades para os munícipes e turistas. Milton Santos, em “Por uma Economia Política da Cidade” enfatizava como a vocação mundial ou nacional das cidades pode resultar num projeto urbano excludente. Entendendo tais questões, as cidades buscam uma estratégia pública de alinhamento das expectativas privadas e da garantia de direitos. Secretarias como a de Desenvolvimento Social em Saquarema ou a de Planejamento e Modernização da Gestão de Niterói simbolizam um passo para um modelo de prestação pública voltada para resultados sociais. Maricá, por sua vez, reserva sua própria empresa pública de desenvolvimento, a CODEMAR, solidificando a proposta estratégica do município na consolidação de sua infraestrutura de Estado.
Em paralelo traçado das gestões, evidencia-se a preocupação com um modelo público de planejamento estratégico que se paute na noção de garantias de direitos como fator essencial para a dignidade da pessoa humana e no desenvolvimento a partir das potencialidades da própria população. Da “Cidade do Surf” à “Cidade das Utopias”, estimula-se o comércio de proximidade e as oportunidades produtivas dos moradores na medida em que os impulsos públicos e privados se direcionam para o mesmo cumprimento de objetivos.
Em Niterói, por exemplo, o projeto do Restaurante Popular do Fonseca significa uma iniciativa que vai além da assistência alimentar, buscando o envolvimento comunitário e a geração de empregos locais. O programa “Niterói Solidária” também capta os ímpetos sociais da sociedade civil para a distribuição de mantimentos e cestas básicas. Por sua vez, para garantir um futuro mais promissor para a juventude, Saquarema e Maricá instituíram programas como o Conexão Futuro e Passaporte Universitário. Essas políticas buscam ampliar o acesso ao ensino superior e os horizontes da jovem população das cidades. A utilização de fundos soberanos para a formação de uma poupança de longo prazo é outra estratégia empregada quando se remete à gestão pública. Tal recurso visa a formação de uma reserva que permita planejamentos estruturais, indo além das gestões de turno e oferecendo uma orientação para o futuro das cidades pós-royalties.
Para além dos resultados provenientes dos royalties da Bacia de Santos, o exemplo do leste fluminense nos leva a entender o papel indutor do Estado e a importância de um elemento chave para a definição de cidades inteligentes: a economia voltada para as próprias potencialidades da população. No estímulo de dirimir as separações sociais existentes no seio urbano, o que Saquarema, Maricá e Niterói nos mostram é que o uso inteligente de investimentos pode ser um catalisador de transformações profundas, principalmente, quando assumem um planejamento estratégico voltado à inovação e expansão em políticas públicas de solidariedade.
Patrick Scalco, Advogado em MBA de Gestão Estratégica e Inovação na Universidade Celso Lisboa, membro do Instituto Joaquim Herrera Flores na observação e análise de políticas públicas.
Muito interessante! Nunca tinha lido uma matéria com essa perspectiva…