Má gestão da Lei Aldir Blanc revela falhas crônicas em editais culturais
Auditoria comprovou uma reclamação histórica, de que os premiados se repetem com frequência há muitos anos, e a aplicação dos recursos assistenciais acabou reproduzindo o mesmo modelo de concentração de premiados
Foram muitos equívocos localizados por conselheiros, fóruns, entidades, observatórios, imprensa e especialmente pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) em todas as etapas de procedimento da Lei Aldir Blanc (LAB) e demais editais de mecanismos de fomento como Mecenato Subsidiado e Fundo de Cultura pela Superintendência-Geral de Cultura do Paraná (SGC-PR) da Secretaria Estadual de Comunicação e Cultura (SECC-PR). Em auditoria técnica o Acórdão nº 2877/21 – Tribunal Pleno, 10 de novembro, na edição nº 2.658 do Diário Eletrônico do TCE-PR, página 3, confirmou as denúncias apresentadas nesta série de reportagens.
Diversas denúncias efetivadas pela Ordem dos Músicos do Brasil (CF-OMB), Fórum de Cultura do Paraná (FCP), OCB, Seped-PR, e lideranças de povos indígenas, ciganos, do movimento negro, famílias circenses, entre outras relacionadas às exclusões e concentrações de premiados foram confirmadas pelo TCE-PR. Na mesma auditoria se comprovou uma reclamação histórica, de que os premiados se repetem com frequência há muitos anos, e a aplicação dos recursos assistenciais acabou reproduzindo o mesmo modelo de concentração de premiados. Essas falhas já haviam sido denunciadas em reportagens e relatórios anteriores à publicação da auditoria do TCE-PR, que explicam a origem dessas falhas, em problemas internos em todos os procedimentos da LAB na SECC, mas também expõem a fragilidade e insegurança jurídica das normativas e procedimentos que determinam vencedores e perdedores dos editais de cultura – um panorama que em geral se reproduz em todo o Brasil.
Nos achados realizados pelo TCE-PR, estão demonstrações de que não existem políticas, normas, critérios que deem confiabilidade aos editais de cultura. Dentre os quinze principais achados, alguns impactam diretamente na má aplicação de editais:
“(…) 3) Falhas no acompanhamento dos programas: insuficiência dos indicadores de desempenho; (…) 5) Concentração de patrocinadores e de proponentes; 6) Descoordenação das políticas públicas e sobreposição de projetos para distribuição de recursos; (…) 8) Inexistência de procedimentos operacionais e normatização interna para os programas culturais; (…) 10) Aprovação de projetos culturais com base em pareceres de análise superficiais e pro forma; (…) 14) Baixo desempenho na distribuição dos recursos nos editais da Lei Aldir Blanc e dificuldades na interlocução junto aos Municípios; 15) Subaproveitamento dos recursos do PROFICE devido à morosidade na sua tramitação.” (TCE-PR, 2021, p. 178).
Lei Aldir Blanc: análise por cargos comissionados no lugar de técnicos
Segundo a auditoria do TCE-PR, falta equipe e capacitação dentro da SGC-PR. Além do desmonte evidente do órgão ao longo dos anos, existem outros problemas no quadro funcional, como o documento revela no achado 7, sobre “quadro de pessoal com lotação insuficiente, vínculo precário, inadequado ou em desvio de função”. O relatório informa que a condição localizada seria precária: “A Secretaria de Cultura dispõe de 124 (cento e vinte e quatro) servidores, distribuídos em 13 (treze) unidades de atuação. Do total de colaboradores, 25 (vinte e cinco) são detentores de cargos efetivos na SECC e 23 (vinte e três) possuem cargo efetivo em outro órgão do estado, mas exercem atividades na SECC. Dentre os 49 (quarenta e nove) que exercem cargo em comissão, 6 (seis) possuem cargo em comissão em outro órgão do estado, mas exercem atividades na SECC. Desproporcionalidade entre vínculos efetivos e precários; Servidores efetivos lotados em outros órgãos do Estado (SEED) exercendo funções na SECC; Termo de Cooperação Técnica com a SEED em constante renovação, caracterizando possível desvio nas atribuições originárias dos cargos e desrespeito ao requisito de ‘caráter temporário’ da cessão; Servidores comissionados lotados em outros órgão do Estado (Casa Civil) exercendo atividades na SECC; Cessão de servidores comissionados sem amparo legal e processual” (TCE-PR, 2021, p.213).
Além dos fatores citados acima, existem relatos anônimos do meio cultural de trocas e empréstimos de funcionários entre a Fundação Cultural de Curitiba (FCC) e Superintendência-Geral de Cultura do Paraná ao longo de diferentes gestões nas últimas décadas, revelando uma incômoda intimidade entre ações e visões políticas dos organismos municipal e estadual, que também determinam políticas que se equivalem, ambas voltadas à capital Curitiba.
A auditoria do TCE-PR revelou um fato que vai além da falta de capacitação da equipe da SGC-PR. Ao invés de indicações de servidores do quadro técnico, os trabalhos da LAB foram repassados aos funcionários com cargos comissionados alocados na Coordenação de Ação Cultural (CAC) e na Coordenação de Incentivo à Cultura (CIC).
Conforme a auditoria do TCE-PR revela, apesar de existirem 5% do total de recursos da LAB que deveriam ter sido aplicados na contratação de trabalho técnico e operacional para gerir os repasses da LAB no Paraná, a SGC-PR optou por colocar cargos comissionados (escolhidos politicamente) da CAC e da CIC para cuidarem de quase todos os trabalhos envolvendo a LAB no Paraná. Segundo o OCB, foram devolvidos os 5% do total da LAB, na casa dos milhões de reais, que podiam ser usados para gerir os recursos, que permitiriam contratações de profissionais temporários, sendo uma escolha irracional de gestão, que prejudicou a efetividade da aplicação dos recursos assistenciais, causando danos a milhares de pessoas.
Outro fator relatado, mas que ainda não foi comparado nas pesquisas, é a formação de redes de parentesco, amizade e laços afetivos entre premiados e funcionários da Secretaria Estadual de Comunicação e Cultura (SECC-PR), onde está alocada a Superintendência-Geral de Cultura do Paraná, e ainda com funcionários da Fundação Cultural de Curitiba (FCC). Este fato foi muito comentado por agentes da classe, não sendo trabalho fácil localizar mais informações, ficando para agentes públicos competentes o cruzamento. O Portal da Transparência fornece a relação de servidores, porém muitos podem estar vinculados em outros órgãos, como expôs o TCE-PR.
Editais mal executados
No relatório da Superintendência-Geral de Cultura do Paraná, “Lei Aldir Blanc no Estado do Paraná, renda mensal e fomento Paraná 2020” aprovado pelo Conselho Estadual de Cultura do Paraná (Consec-PR), a organização apresenta uma execução positiva da LAB, absolutamente incompatível com a realidade revelada pelo TCE-PR.
Relatos de ex-conselheiros da Consec-PR para a reportagem revelaram que os membros ativos e que promoviam análises foram exonerados ou pediram exoneração do organismo, restando apenas aliados da gestão na casa. Isso pode ser indício do motivo da aprovação do relatório sem ressalvas, apesar de números que podem ser considerados insatisfatórios.
Por outro lado, diversas solicitações de informação feitas aos órgãos de cultura não foram respondidas, ocasionando passagens nebulosas no acesso aos dados e indicadores, que seguem sem respostas, pois nem mesmo a auditoria do TCE-PR pôde se posicionar em algumas questões, por falta de dados primários.
A auditoria do TCE-PR apresenta no item “6.3 Achado 3 − falhas no acompanhamento dos programas: insuficiência dos indicadores de desempenho”, a reflexão de que o grupo de indicadores utilizados pela Secretaria de Cultura seria “insuficiente para o monitoramento da execução (in curso) e para a avaliação do desempenho dos programas e políticas públicas (ex-post)” sendo contraditórias com as diretrizes estabelecidas no Plano Estadual de Cultura (PEC), no Plano Pluri Anual (PPA) e nos planos de ação. E continua: “faz-se menção à incapacidade dos indicadores selecionados em: (a) promover correção de rumos entre editais e credenciamentos; (b) representar, em termos de volume e complexidade, os objetivos para os quais servem de constructo e (c) possibilitar visão avaliativa em relação às metas traçadas.” (TCE-PR, 2021, p.36).
O mesmo relatório reforça que é responsabilidade do órgão gestor o acompanhamento do desempenho dessas políticas previstas no Plano Estadual de Cultura, “Art. 10º – Compete à Secretaria de Estado da Cultura monitorar e avaliar periodicamente o alcance das diretrizes e eficácia das metas do Plano Estadual de Cultura com base em indicadores regionais e locais que quantifiquem a oferta e a demanda por bens, serviços e conteúdos, os níveis de trabalho, renda e acesso da cultura, de institucionalização e gestão cultural, de desenvolvimento econômico-cultural. (TCE-PR, 2021, p.36).
O que se observa é que os dados apontam pioras nos níveis de resultados, tanto de aplicação de recursos próprios, como de efetividade de metas apontadas. Seria para o TCE-PR dissonante o pretendido e o realizado.
“Ante a falta de estudos técnicos ou dados estruturados, os recursos são divididos entre categorias culturais e abrangências com base em dados históricos, os quais, na prática, mostram-se ineficientes, atingindo resultados significativamente dissonantes das metas planejadas. (…) Assim, no lançamento dos editais subsequentes, a divisão dos recursos por categoria cultural e abrangência é feita baseada em dados históricos, conforme quantitativos auferidos em edições anteriores. (…) Os demais critérios utilizados são construídos em lógica de tentativas e erros, como mostra o relatório apresentado na Solicitação de Documentos e/ou Informações nº A01/2021, resposta 3.5, em que as faixas orçamentárias vão sendo alteradas com base nos resultados do edital anterior e no local de domicílio do proponente (embora as readequações sejam necessárias, elas pecam por tempestividade)”. (TCE-PR, 2021, p.15-23). (…) “Sendo ainda uma falha de confiabilidade dos indicadores utilizados” (TCE-PR, 2021, p.37)
Os vícios localizados demonstram que após os premiados contumazes terem se estabelecido, os indicadores para editais futuros serão os mesmos, segundo conclusão da auditoria, reproduzindo fatores que levam a resultados repetitivos.
Para Manoel J de Souza Neto, o relatório da Superintendência-Geral de Cultura da LAB no Paraná seria irreal. “Algo como um episódio da Ilha da fantasia, seriado dos anos 70. O relatório esconde índices socioeconômicos, raciais, desigualdades regionais e de renda, por exemplo”, comenta.
A precariedade de efetivação dos editais foi outra surpresa que o TCE-PR revelou, posto a total ausência de relatórios completos por parte da SGC-PR. Somente após a auditoria, tomou-se conhecimento dos verdadeiros valores aplicados e da falha de execução dos recursos de ao menos três editais.
Segundo a auditoria do TCE-PR do fim de 2021, no inciso II da Lei Aldir Blanc os municípios não abriram editais, deixando espaços culturais independentes fecharem. Os valores recebidos foram R$ 71.915.814,94, executados R$ 16.209.000,00, portanto 22,54%. No Inciso I da lei (para Renda Emergencial Mensal), dos R$ 28.766.325,98 apenas R$ 2.088.000,00 foram utilizados, ou apenas 7,26%. No caso do Inciso III (voltado a fomento), dos R$ 43.149.488,96 foram utilizados R$ 14.121.000,00, ou apenas 32,73%.
No caso dos editais, esse problema fica mais evidente. Um exemplo é o Edital de Concurso no 003/2020, Prêmio Jornada em Reconhecimento à Trajetória, criado para premiar “Mestres da Cultura Popular”. Além de ter beneficiado funcionários públicos, pagou R$ 20 mil por beneficiado, para uma ampla maioria de jovens brancos com curso superior, moradores dos bairros nobres de Curitiba (71% dos premiados), boa parte com menos de dez anos de experiência, incompatível com um edital dedicado ao reconhecimento de trajetórias. 53,28% dos premiados tinham menos de 39 anos de idade, ocasionando desvios de finalidade, em somatório superior a R$ 4 milhões.
O Estado aplicou 99,5% dos recursos no caso do Prêmio de Reconhecimento de Trajetória, ou seja, R$ 7,96 milhões dos R$ 8 milhões previstos. A mesma eficácia no gasto dos recursos se repetiu na chamada pública nº 005/2020, de 5 de outubro de 2020, Outras Palavras – Prêmio de Obras Literárias, em que dos R$ 3,2 milhões foram gastos R$ 3,18 milhões, ou seja, 99,38%.
Mas em outros casos, como as chamadas públicas nº 004; 006; 008 e 009/2020, que tinham valores menores, se atingiu uma parca eficiência dos resultados, sendo respectivamente Cultura nas Redes – Licenciamento de Conteúdo Digital (de R$ 10 milhões, apenas R$ 1,69 milhão utilizados, ou seja, 16,9%), Prêmio Registros Fotográficos e Audiovisuais: Difusão de Saberes e Fazeres Tradicionais (de R$ 1,04 milhão, apenas R$ 244 mil utilizados, ou seja, 23,46%), Prêmio Produtos Artesanais: Difusão de Saberes e Fazeres Tradicionais (de R$ 1,16 milhão, apenas R$ 86 mil, utilizados, ou seja, 7,41%), Prêmio Pesquisadores Independentes: Difusão de Saberes e Fazeres Tradicionais (de R$ 336 mil, apenas R$ 126 mil utilizados, ou seja, 37,5%), Editais de Grafite e Pontos e Pontões de Cultura (de R$ 7.563.488,96, não foram feitos repasses, portanto R$ 0,00, ou seja, 0,00%).
Observou-se que a gestão atingiu os piores resultados em premiações que envolviam culturas populares, agrupamentos tradicionais, etnias, artesãos e manifestações urbanas periféricas, além do desvio de finalidade do Edital Trajetórias. Números que segundo a OCB tornam irrefutáveis as denúncias de racismo estrutural e dos maus resultados obtidos pela Superintendência-Geral de Cultura do Paraná na Lei Aldir Blanc apresentados pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná.
Problemas de certificação em editais, projetos duplicados entre FCC e SECC
Conforme confrontados pela auditoria do TCE-PR, os editais da SECC e da FCC, custeados com recursos próprios ou no âmbito da Aldir Blanc, “verifica-se volume ainda maior de projetos idênticos aprovados”. Conforme amostragem de uma tabela com quase uma centena de casos, o Quadro 11 − Projetos aprovados pela SECC e FCC, exemplifica o problema:
Segundo as normas apresentadas na Auditoria pelo TCE-PR, não seria correto o pagamento dos recursos de prêmios de editais para o mesmo projeto em editais ou programas distintos.
O achado 5, que se refere a “Concentração de patrocinadores e de proponentes”, afirma que segundo o Decreto do Estado do Paraná nº 8.679/2013, § 2º, o proponente que tiver dois projetos aprovados só poderá concorrer novamente aos recursos do Profice (Programa Estadual de Fomento e Incentivo à Cultura do Paraná) após a conclusão de um deles, com a respectiva aprovação da prestação de contas. E ainda na Resolução n° 48/2021-SECC, o Art. 8º diz que “Cada proponente poderá apresentar e ser contemplado em apenas 01 (um) projeto”. Na Lei nº 14.017/2020 (Lei Aldir Blanc) o § 1º afirma que “os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão desempenhar, em conjunto, esforços para evitar que os recursos aplicados se concentrem nos mesmos beneficiários, na mesma região geográfica ou em um número restrito de trabalhadores da cultura ou de instituições culturais”.
As mesmas questões seguem na orientação geral das políticas culturais, no Portal do Sistema Nacional de Cultura. Seu inciso 38 recomenda: “Pode-se incluir nos editais um valor limite para recebimento por pessoa com recursos da Lei e transferir a responsabilidade ao beneficiário? Recomenda-se que o Ente responsável pela distribuição dos recursos da Lei Aldir Blanc desenvolva mecanismos de controle que garantam a não concentração dos recursos para os mesmos CPFs e CNPJs beneficiários desses recursos, sob pena de serem instados a apresentar justificativa e/ou responsabilização no caso de verificação de concentração” (TCE-PR, 2021, p.200).
As informações legais obtidas acima, por meio do TCE-PR, revelam no cruzamento de dados do que foi aplicado que, objetivamente, a Superintendência-Geral de Cultura do Paraná feriu com os objetivos da aplicação da Lei Aldir Blanc.
Uma distribuição correta dos recursos, a fim de evitar duplicidade de prêmios, nos mesmos nomes e projetos, ou de concentração de muitos prêmios nos mesmos CPFs e CNPJs, ou ainda concentração regional, também tinha previsões legais, com base na recomendação de articulação entre estados e municípios, o que incluiria troca efetiva de dados entre os entes, o que de fato, como a auditoria revela, não ocorreu.
No achado 6, que se refere à “descoordenação das políticas públicas e sobreposição de projetos para distribuição de recursos”, está exposto que na Lei nº 14.017/2020 (Lei Aldir Blanc) existia previsão, segundo § 3º, “para a execução das ações emergenciais previstas no inciso III do caput, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios definirão, em conjunto, o âmbito em que cada ação emergencial será realizada, de modo a garantir que não haja sobreposição entre os entes federativos”. O mesmo se repete novamente na recomendação do Portal do Sistema Nacional de Cultura, na pergunta 3. “Qual o entendimento de ação ‘em conjunto’ prevista no art. 2º, § 3º, do Decreto? Há necessidade de instrumento formal para efetivação dessa situação?”. A resposta informa que “caberá aos Estados a coordenação em conjunto com os municípios de sua territorialidade, de forma a garantir que não haja sobreposição de iniciativas, nem a concentração de recursos em beneficiários específicos durante a execução dos instrumentos previstos no inciso III do art. 2º da Lei 14.017/2020”. (TCE-PR, 2021, p.195-209).
O achado 6 ainda afirma que o “uso de documentação apenas declaratória, em que o proponente preenche modelo de termo atestando que não foi contemplado por outro edital com o mesmo projeto” revelaria “falta de controles sistematizados que permitam cruzamento de informações entre diferentes programas, inclusive entre esferas que se utilizam do mesmo sistema”. Por resultado, a auditoria informa que ocorreu “Sobreposição de editais e programas. Foram observados casos de aprovação de um mesmo projeto: i) em esferas diferentes (tanto na SECC como na FCC) no âmbito da Lei Aldir Blanc ou financiados com recursos orçamentários (Cultura Feita em Casa e Licenciamento de Obras Audiovisuais, FCC Digital I e II e Música Independente FCC); ii) dentro da SECC, entre editais diferentes. (editais da Aldir Blanc e programas Cultura Feita em Casa e Licenciamento de Obras Audiovisuais)”. E teria ainda gerado o “Descumprimento de cláusulas editalícias (editais da Lei Aldir Blanc, Cultura Feita em Casa e Licenciamento de Obras Audiovisuais)”, bem como “Acentuação do problema de concentração de recursos em um grupo de proponentes”. (TCE-PR, 2021, p.195-209).
Esse grande volume de equívocos expõe a ausência de institucionalidade, especialmente no achado 2 (sobre “Ausência de estudos e indicadores de transversalidade nas políticas públicas de cultura”) pois “em contraponto ao descrito nas leis e planos que estabelecem diretrizes culturais, não se encontram implementados mecanismos formais de planejamento, execução e acompanhamento de políticas públicas articuladas, tendo em vista a inexistência de indicadores que correlacionem variáveis de diferentes políticas públicas”.(TCE-PR, 2021, p.186).
Dentro do mesmo achado, a auditoria segue afirmando que a causa desses erros de gestão seria “falta de um modelo de gestão e acompanhamento dos programas culturais; Falta de articulação junto à SEPL [Secretaria do Planejamento e Projetos Estruturantes]; falta de compreensão da função exercida pelos indicadores, especialmente a valorativa”. E por efeito, o TCE-PR ainda afirma que ocorreu “falhas de representatividade, sensibilidade e confiabilidade dos indicadores utilizados para desempenho das políticas públicas; o uso de indicadores simples pelo PROFICE resulta na perda da função avaliativa ou valorativa do indicador; comprometimento do caráter estratégico da condução das políticas públicas; falta de evidências para tomada de decisão na correção de rumos e na resolução dos problemas encontrados entre editais e credenciamentos”. (TCE-PR, 2021, p.192).
A situação revela a ausência de controle e certificação de vedações (previstas nos próprios editais, leis e práticas da boa administração pública), com acúmulos de projetos iguais, dos mesmos proponentes, que foram financiados mais de uma vez com recursos públicos, colocando a lisura do processo em xeque.
“Segundo Gehad Hajar, a distribuição de recursos ocorreu sem o cuidado mínimo exigido de averiguação das fases de habilitação, homologação, ordenador despesas, certificação, após a entrega do produto e relatório, seja no edital ou termo de referência, nos pagamentos, e o que foi executado, verificado, para que um processo possa ser encerrado, após a prestação de contas. ‘O controlador interno destes órgãos poderia ter reagido, posto que fazem meses que essas denúncias estão vindo à baila na imprensa e redes sociais, além de ofícios enviados aos órgãos, podendo interferir a qualquer momento de posse das informações, mas não o fez’, afirma Hajar. Agora que as atividades demonstram indícios de irregularidades, cabe ao controlador externo, CGE, TCE, ou MP tomar providências.” (A Política Paraná, 05/05/2021)
O cruzamento de outros editais dos últimos anos, que ainda não constam dessas auditorias, revelou que as situações contraditórias de resultados de editais com os objetivos das políticas públicas se repetem, sendo regra e não exceção, segundo o OCB.
Problemas estariam se reproduzindo em diversos editais
Não apenas a aplicação da LAB apresentou problemas de execução. Na análise documental realizada pelo TCE-PR, surgiram aspectos relacionados aos principais programas culturais (Paraná Cultural, PROFICE e editais da Lei Aldir Blanc). Durante as reuniões entre a auditoria e o órgão de cultura, foram solicitadas informações sobre “políticas públicas, sistemas informatizados, prestação de contas e parte contábil dos programas” e também solicitadas informações sobre Sistema do Programa Estadual de Fomento e Incentivo à Cultura (SISPROFICE) “a fim de avaliar os projetos nele cadastrados”. (TCE-PR, 2021, p.14-20). Que se constatou que: “em suma, observa-se que a falta de representatividade, mensurabilidade e de confiabilidade nos indicadores constantes no PPA e nos programas extraorçamentários compromete o caráter estratégico da condução das políticas públicas, vez que não se utiliza a função valorativa dessas métricas. Consectariamente, os indicadores adotados para acompanhamento das políticas públicas e programas culturais não dão suporte à tomada de decisão para correção de rumos e na resolução dos problemas encontrados (in curso) e não servem como baliza técnica para acompanhamento de resultados.” (TCE-PR, 2021, p.39-40).
A ausência de institucionalidade nas políticas de editais públicos de cultura tem por referência técnica, após análise da auditoria, a constatação de que ocorreu:
“14) Baixo desempenho na distribuição dos recursos nos editais da Lei Aldir Blanc e dificuldades na interlocução junto aos Municípios; 15) Subaproveitamento dos recursos do PROFICE devido à morosidade na sua tramitação”. (TCE-PR, 2021, p.178).
O caso expõe, segundo o OCB, que não existem dados suficientes que permitam a análise de confiabilidade das políticas adotadas, tampouco dados que permitam a comprovação da eficácia e lisura dos processos envolvendo os editais de cultura do Paraná, pois o órgão não adotou o uso de métricas e indicadores e, portanto, não permite acompanhamento desde a elaboração até o pagamento desses editais.
“A SECC se comprometeu com TCE-PR na melhoria dos sistemas, através de criação de “relatórios gerenciais para identificar perfil dos projetos contemplados e não contemplados. Distribuição entre capital e interior, municípios, macros, áreas. Conhecer a distribuição dos valores captados, liberados e percentual de execução; Quantidade de projetos por proponentes envolvendo todos os editais com o intuito de verificar possível acúmulo de recursos recebidos / pleiteados. Agentes Culturais: Relatório gerencial com perfil de agentes: gênero, área, categoria, município, macrorregião, etc.” (TCE-PR, 2021, p. 40-41).
Até o momento não existem informações de previsibilidade de resolução dos graves problemas de gestão localizados.