O fantasma do comunismo ronda as eleições municipais em 2024
Candidatos procuram articular a tese do fantasma comunista para proteger seus interesses financeiros e políticos. Eles buscam manter privilégios e evitar que haja maior ascensão social no Brasil
“Contra o consórcio comunista!”, esse é um dos slogans políticos mais repetidos no debate eleitoral na cidade de São Paulo. Um dos candidatos com maior difusão nas redes sociais, Pablo Marçal, apoiou-se em uma antiga estratégia política brasileira: o anticomunismo.

Créditos: TSE
Embora pareça que o candidato à cadeira de prefeito traga algo novo para o debate político, na verdade, ele reproduz diversas falas utilizadas na última década pelos apoiadores de Jair Bolsonaro. Apesar de haver lançado um livro contra o Marxismo Cultural em 2021, Marçal pouco atuou com essa bandeira em debates públicos. A sua estratégia política é recente, mas inspirada no ex-presidente da República.
Longe de ficar restrito a São Paulo, em outro polo importante, a cidade do Rio de Janeiro, encontrou-se pelo menos dois candidatos que bebem dessa mesma tradição anticomunista: Ramagem e Rodrigo Amorim. Ambos, em horários eleitorais ou no plano de governo, costumam frisar a luta contra a “esquerda e os marxistas culturais”.
O fantasma do comunismo é uma antiga tese que rondou o Brasil em diversos momentos do século XX. Essa tese difundida por pessoas ligadas à extrema-direita e direita argumentam que o país está prestes a chegar a uma revolução comunista. Ela levaria o país à pobreza e à destruição, portanto, as elites conservadoras deveriam salvar a nação com medidas autoritárias e de exceção.
Na República Velha, nos anos de 1920, o surgimento do Partido Comunista Brasileiro (PCB) fez com que o governo brasileiro deportasse estrangeiros suspeitos de revolução. Era uma embrionária perseguição que ganharia mais força com o surgimento da Revolução de 1930, liderada por Getúlio Vargas.
A partir do carismático líder gaúcho, o Exército e as Forças Armadas de maneira geral encamparam a tese do fantasma comunista. Esse movimento foi se repetindo em dois momentos cruciais. Em 1937, utilizou-se o fantasma comunista para dar um golpe que garantiu o Estado Novo.
Essa estratégia voltou a ser usada em 1964, dessa vez em um contexto internacional marcado pela disputa bipolar da Guerra Fria, quando as Forças Armadas se valeram do fantasma comunista para garantir o golpe militar. Criou-se uma rede intensa de espionagem e perseguições contra opositores sob justificativa que eram “revolucionários”.
Entretanto, o fantasma comunista perdeu força e folego após o fim da Guerra Fria. A nova constituição e o retorno à democracia diminuíram a importância dessa retórica, exceto em estratos muito reduzidos da população, como clubes militares ou políticos excêntricos, como Enéas Carneiro. Mas o que isso tem a ver com as eleições municipais atuais? E por que a elite conservadora articula esse discurso do fantasma comunista?
É importante notar que a estratégia do fantasma comunista não é nova, e atualmente ganhou novos contornos sob a batuta de Jair Bolsonaro. Os discursos políticos mudaram, mas o inimigo é o comunista. Agora, utiliza-se termos como esquerda, comunistas, marxistas culturais, globalistas, como sinônimos. É uma maneira de simplificar o entendimento dos apoiadores para que lutem contra pessoas que não apoiem as pautas conservadoras da família, pátria e mercado.
Depois, percebe-se que os políticos conservadores atuais envolvidos com as Eleições de 2024, de forma esperta, utilizam-se dos slogans “Contra o consórcio comunista” para conseguir articular e ganhar aprovação perante os apoiadores do ex-presidente da república. Vale lembrar que Bolsonaro, diferentemente de Marçal, Amorim ou Ramagem, foi formado como anticomunista na Escola dos Agulhas Negras (AMAM) no período militar, e depois como político profissional, utilizou o Congresso Nacional para falar dessas pautas anticomunistas.
De qualquer forma, eles se aproximam quando procuram articular a tese do fantasma comunista para proteger seus interesses financeiros e políticos. Eles buscam manter privilégios, e evitar que haja maior ascensão social no Brasil. Há um discurso violento contra programas sociais e políticas públicas inclusivas.
Para concluir, é bom observar que a tese de que o comunismo está chegando não é restrita ao solo nacional. Ela está presente em outros países, especialmente, nos Estados Unidos da América com Donald Trump e seus apoiadores políticos utilizando nas Eleições presidenciais contra os candidatos democratas. O fantasma comunista está a solta. Corram!
Danilo Sorato é professor de História e Relações Internacionais. Doutorando em Estudos Estratégicos pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Escreveu diversos artigos acadêmicos e jornalísticos sobre as relações internacionais do Brasil, em especial os governos Temer, Bolsonaro e Lula.