Por uma aposentadoria realmente universal
Contra a opinião das organizações de trabalhadores e empregadores, o presidente Emmanuel Macron está obstinado a reformar a Previdência. A uniformização, o modelo proposto, implica a elevação da idade da aposentadoria integral e arrisca levar empobrecimento para a maioria. A reflexão sobre um verdadeiro modelo universal passa por um caminho bem diferente.
Na ampla mobilização do início de 2020 contra o projeto de reforma da Previdência na França, as reivindicações se pautaram majoritariamente no sistema existente. Visando à manutenção do nível de vida dos aposentados, a demanda era de que o valor das pensões fosse melhor ou ao menos igual que último salário recebido. Dessa forma, valida-se a reprodução das desigualdades do mundo do trabalho para aqueles e aquelas que o deixam.
Como justificar que um executivo receba uma pensão melhor do que uma faxineira? Por que ele mereceria ganhar mais para cuidar de seu jardim, ajudar sua família ou participar da vida associativa, ler ou ir pescar? Os argumentos habitualmente apresentados para justificar as diferenças de salário – diferenças de qualificação, de motivação, de investimento, de dificuldade, de “produtividade” ou de “empregabilidade” – não podem mais ser evocados na aposentadoria. A essa pergunta jamais formulada, a resposta implícita reside frequentemente em uma visão da aposentadoria como um salário diferenciado, justificado pela necessidade de prolongar o nível de vida – um pobre estaria acostumado a ser pobre. Para outros, um salário alto daria direito a uma boa aposentadoria porque estaria associada a uma cotização proporcional. Os filhos de quem paga mais imposto deveriam receber uma educação e uma saúde melhores? Em um sistema por repartição, não se trata de recuperar o que se pagou.
No momento em que nosso modelo de sociedade é balançado pela crise da Covid-19, diversas iniciativas nos chamam a redefinir os contornos de um mundo sustentável. Não é o momento de considerar substituir a lógica contributiva atual da aposentadoria por um novo direito universal, independentemente do nível e da duração da cotização? Todo ser humano poderia dispor de uma pensão idêntica a partir de certa idade. Esse princípio estaria de acordo com o do sistema de saúde público ou dos serviços que oferecem a cada um os mesmos serviços, qualquer que seja o nível da cotização associado a seu salário. Para cogitar a viabilidade e o interesse de uma verdadeira aposentadoria universal, convém encontrar as melhores respostas para as questões legítimas que surgem.
Qual poderia ser o valor dessa aposentadoria única? Ele deveria depender evidentemente de escolhas democráticas. Podemos imaginar, por exemplo, que ele seja fixado em 2 mil euros líquidos por mês, ou seja, ligeiramente menos do que a renda média por adulto da França (2,2 mil euros líquidos hoje, fora rendas de capital). Esse valor, claramente acima da aposentadoria média atual (1.444 euros líquido por mês), significaria um aumento das pensões para mais de 80% dos 17,2 milhões de aposentados atuais (após deduções das cotizações sociais, mas antes dos impostos).1
Uma aposentadoria única não resolveria todas as desigualdades, entre as quais as ligadas ao patrimônio, às rendas de capital ou à responsabilidade financeira sobre crianças, desigualdades essas que deveriam ser reguladas pelo imposto, garantia de serviços públicos de qualidade. A partir de que idade? Esticar o fim da atividade para além dos 60 anos priva as pessoas dos melhores anos da aposentadoria, já que a esperança de vida com boa saúde é de 64 anos. O mundo do trabalho, inclusive, rejeita boa parte dos idosos, que têm dificuldades em encontrar empregos em seus últimos anos de atividade. Além disso, elevar a idade priva mecanicamente os mais jovens do acesso ao trabalho: mais de 1 milhão de empregos são ocupados por pessoas com mais de 60 anos, um número que deve aumentar. Para responder ao desemprego em massa é necessária uma partilha do trabalho, já que o crescimento perpétuo não é possível nem desejável de um ponto de vista ecológico.
Quanto custaria essa aposentadoria e como financiá-la? Uma aposentadoria de 2 mil euros líquidos para todos a partir da idade legal atual de 62 anos criaria a necessidade de um financiamento suplementar de cerca de 80 bilhões de euros, ou seja, 3,4% do PIB. Esse número aumentaria para 110 bilhões de euros, ou seja, 4,7% do PIB, no caso de uma aposentadoria de 2 mil euros líquidos a partir dos 60 anos. O esforço necessário para essa revolução social representa um aumento de cerca de 10% em média das deduções obrigatórias, o que poderia ser feito nos salários mais elevados, introduzindo, por exemplo, uma progressão nas cotizações e cobrando mais das rendas de capital. Lembremos que a introdução do “desconto único” em 2018 estipulou um teto para o imposto de renda do capital em 12,8% (fora taxas sociais), muito abaixo da última fatia de imposto de renda, fixada em 45%. Esse esforço financeiro estabeleceria uma partilha da riqueza produzida, o que parece mais legítimo do que condenar os aposentados a um empobrecimento progressivo ao estipular um teto das aposentadorias em 14% do PIB, como considerava fazer o governo antes da crise sanitária.

Direito ao repouso
Não existe um risco de incitar os “ricos” a capitalizar durante sua vida ativa para compensar a alta diminuição de sua renda na aposentadoria? Não podemos ser ingênuos; os mais privilegiados já capitalizam de diversas maneiras: aplicações na Bolsa, planos de aposentadoria privada, imóveis etc. Nivelar as rendas entre o período de atividade e o período de aposentadoria não é ilegítimo nem problemático, a partir do momento em que os fundos de pensão são proibidos. A poupança poderia assim ser orientada para um financiamento com baixas taxas de investimentos públicos – para a transição ecológica, por exemplo –, em vez de se dirigir a produtos especulativos altamente remuneradores, que não respondem a uma necessidade real e infelizmente são frequentemente não taxados. Essa orientação da poupança poderia ser feita por uma via regulamentar, por exemplo, ao impor uma porcentagem mínima de aplicações financeiras no financiamento de investimentos públicos e ecológicos.
Tal proposta poderia ser aceita? Ela deve encontrar retorno positivo junto a 80% dos futuros aposentados que veriam sua pensão aumentar em relação ao sistema atual. Mesmo para os outros, essa aposentadoria, associada a um serviço público de qualidade, ofereceria direito ao repouso garantido, quaisquer que fossem as dificuldades da vida, sem medo de envelhecer na precariedade financeira e sem medo por seus filhos, parentes e próximos. Em troca de qual renúncia? A capacidade de consumir mais em um planeta com recursos limitados? Hoje, muitos, em particular entre os mais jovens, têm uma consciência aguda da necessidade de compartilhar para enfrentar a crise social e ambiental que surge diante de nós. Além do mais, a instabilidade do sistema os leva a considerar a aposentadoria como uma miragem. A legibilidade e a simplicidade de uma aposentadoria única para todos favoreceriam a recuperação de uma adesão e de uma confiança em nosso destino coletivo.
Anne Debregeas é engenheira de pesquisa da Électricité de France e porta-voz da federação Sud-énergie.
1 Fonte: Ministério das Solidariedades e da Saúde, Direção de Pesquisa, Estudos, Avaliação e Estatísticas (Drees), jul. 2019.