Rússia aposta em arquitetura para reforçar influência global
Ao promover tais encontros, Brics busca se afirmar como uma entidade mais tangível e influente, explorando novas possibilidades econômicas e culturais
Entre os dias 6 e 8 de fevereiro de 2025, a Rússia sediou o IV International Architecture and Construction Forum “Kazanysh” em Kazan, em um esforço para fortalecer o Brics como uma entidade mais tangível e influente no cenário global. Este evento estratégico reflete a intenção da Rússia de contribuir para que o bloco se torne mais do que uma aliança formal, explorando novas possibilidades econômicas, culturais e estratégicas. O adiamento do evento, inicialmente planejado para ocorrer de 5 a 7 de dezembro de 2024, foi uma decisão estratégica. Informações privilegiadas, concedidas diretamente a nós pelos organizadores do Fórum, revelaram que a mudança de data foi motivada pela expansão do Brics, que em outubro convidou mais treze países para integrar o bloco (Turquia, Indonésia, Argélia, Belarus, Cuba, Bolívia, Malásia, Uzbequistão, Cazaquistão, Tailândia, Vietnã, Nigéria e Uganda). O objetivo era permitir que cada nação convidada enviasse sua própria delegação, transformando o evento no maior de sua história e ampliando significativamente seu alcance e impacto.
Embora o fórum tenha sido uma plataforma técnica, ele também levantou questões sobre as intenções geopolíticas por trás do evento. A Rússia, ao sediar e promover tais encontros, parece buscar reforçar sua presença e influência em um cenário global em que enfrenta pressões externas.

Kazan, a capital do Tartaristão, foi escolhida como sede deste evento devido à sua capacidade de integrar diferentes culturas e religiões. Próximo ao Bilyar Palace Hotel, onde nos hospedamos, encontram-se uma Igreja Católica Romana, uma Igreja Ortodoxa Russa e uma mesquita, simbolizando a convivência harmoniosa entre o Ocidente e o Oriente. Essa característica torna Kazan um local estratégico para eventos do Brics que visam promover a diversidade e a cooperação internacional.
O fórum ocorreu no novo Teatro Galiasgar Kamal, cuja inauguração oficial foi realizada visando este evento. A presença de Nikolay Shumakov, presidente da União dos Arquitetos da Rússia e da União dos Arquitetos de Moscou, destacou a intencionalidade e a importância que o governo russo atribui ao evento.
A presença de autoridades de alto escalão, como o prefeito de Kazan, ao lado de um seleto grupo de especialistas brasileiros, sublinhou a importância e a seriedade do encontro. Em 2025, a participação de uma delegação brasileira tão notável ganha ainda mais relevância, considerando que o Brasil assumirá a liderança do BRICS neste ano. Composta por 11 especialistas, a delegação brasileira destacou-se em debates sobre o potencial turístico e cultural do bloco, além de participar ativamente de painéis sobre arquitetura do futuro, infraestrutura verde e ensino na arquitetura.
Entre os representantes do Brasil, destacaram-se figuras de renome como Odilo Almeida, presidente da Ordem dos Arquitetos do Brasil, e Laurent Troost, arquiteto belga radicado no Brasil, conhecido por seus projetos inovadores e sustentáveis. A participação brasileira não apenas reforçou os laços com os outros países do bloco, mas também sublinhou o papel proeminente que o país pretende desempenhar no cenário internacional durante sua liderança.
Um dos principais objetivos do fórum foi promover o intercâmbio de soluções arquitetônicas entre os membros do Brics, que compartilham níveis semelhantes de economia e desafios de desenvolvimento. A proposta era que arquitetos de diferentes nações compartilhassem seus problemas locais, permitindo que soluções encontradas para uma favela na Índia, por exemplo, pudessem ser adaptadas para o Brasil, e vice-versa. Essa abordagem sugere um afastamento da dependência convencional de nações de primeiro mundo, promovendo a ideia de que “iguais se ajudem como iguais”.
Politicamente, essa estratégia indica um enfoque crescente no Brics enquanto bloco, utilizando eventos como o fórum em Kazan para fortalecer a cooperação interna e projetar uma imagem de unidade e colaboração no cenário global. Ao promover tais encontros, Brics busca se afirmar como uma entidade mais tangível e influente, explorando novas possibilidades econômicas e culturais. Essa movimentação pode ser vista como uma tentativa de consolidar o bloco como uma força relevante no cenário internacional, utilizando meios indiretos para alcançar objetivos claros em uma agenda em curso.
Além do Brasil, o fórum contou com a presença de delegações de países como Índia, Irã, Egito e outros, que demonstraram interesse em explorar novas possibilidades de cooperação com o bloco. Conversamos com profissionais de arquitetura e mídia desses países, e todos, mesmo os mais experientes em eventos internacionais, expressaram surpresa com a magnitude e o esplendor do fórum, conduzido de maneira suntuosa e com um investimento significativo de recursos.
Kazan, com sua rica herança arquitetônica que combina influências orientais e ocidentais, serviu como um cenário apropriado para debates sobre desenvolvimento urbano e inovação na construção. A cidade, com sua capacidade de amalgamar diferentes culturas, simboliza o espírito de cooperação e diversidade que o Brics busca promover.
O Fórum “Kazanysh” não foi apenas um evento técnico; ele serviu como um indicativo das possíveis direções futuras do Brics, sugerindo um bloco que busca se afirmar não apenas economicamente, mas também cultural e estrategicamente. A Rússia, ao sediar e promover tais encontros, está fazendo sua parte para que o bloco se torne uma força mais material e influente no cenário global. Resta observar como essas intenções se desdobrarão no cenário internacional nos próximos anos, especialmente com o Brasil à frente do Brics.
Luigi Falcon é jornalista.