Memórias em espera
Toda tentativa de apagar a história recente, de implementar dispositivos de amnésia, carrega em seu próprio coração o rastro daquilo que deseja apagar, a sombra de uma memória eclipsada
Cinquenta anos depois do golpe civil-militar no Chile, o desenrolar do passado continua sendo um horizonte que desenha silenciosamente nosso presente e os tempos vindouros. Não pode ser de outra forma porque “Todo país é construído sobre uma vila”,[1] conforme escreve Guillermo Calderón na peça Villa, cujo cenário é a Villa Grimaldi. A metáfora da sobreposição de geografias temporais é poderosa: o Chile de hoje ergue-se inevitavelmente sobre uma vila, sobre uma zona de horror, na qual habitam simbolicamente todas as vilas do país, os antigos centros de detenção e tortura, todas as ruínas de um passado recente. A trama de Villa se desenvolve no antigo quartel de detenção e repressão Terranova ativo durante a ditadura de Pinochet, o qual hoje conhecemos como Parque da Paz Villa Grimaldi. Na peça estão três mulheres que debatem profusamente sobre a remodelação do Grimaldi, segundo duas opções: reconstruir a vila ou fazer um…