Uma nova geopolítica dos capitais
A China não é mais somente “a fábrica do mundo”, ela tornou-se o banqueiro dos Estados Unidos. A aliança, porém, não é necessariamente ideológica: Pequim possui a maior reserva mundial de dólares, estimada em US$ 2 trilhões. Qualquer queda da moeda americana provocaria uma alta do iene
A anedota percorreu bancos e instituições financeiras antes de chegar às redações de jornais do mundo inteiro: foi um telefonema do presidente chinês Hu Jintao ao colega George W. Bush que salvou da falência Fannie Mae e Freddie Mac, as duas gigantes do crédito hipotecário americano. Dizem as más línguas que as autoridades chinesas ameaçaram não comprar mais títulos do Tesouro norte-americano e os Estados Unidos tiveram de se curvar. Washington desmente. Pequim contenta-se em sorrir… E remeter aos fatos: Fannie Mae e Freddie Mac escaparam da ruína e os empréstimos chineses de US$ 595,9 bilhões foram garantidos. Apócrifa ou não, a história não deixa de simbolizar mudanças em curso na geopolítica dos capitais.
Os Estados Unidos não estão mais em posição de decidir sozinhos sobre os assuntos financeiros do mundo. Eles estão na berlinda. Em plena Assembléia Geral das Nações Unidas (ONU), em 24 de setembro deste ano, Bush teve de ouvir as reprovações de diversos chefes de Estado. Cara a cara com o presidente americano, eles destacaram que houve um tempo em que sua administração “dava lições às outras nações a respeito das vantagens dos mercados sem entraves”, enquanto hoje “ela renega seu próprio remédio, propondo socorro às instituições financeiras1”.
Alguns dias depois, durante o “Davos chinês”, foi a vez de economistas e dirigentes locais reafirmarem que haviam tido razão em não ceder às pressões para uma total liberalização de seu sistema financeiro.
Nos últimos anos, Liu Mingkang, presidente da Comissão Reguladora dos Bancos, se dedicou a colocar um pouco de ordem nesse setor, tomando o cuidado de manter a influência do Estado chinês sobre os mercados. “Finalmente compreendemos que muitas das coisas que havíamos aprendido com ‘nossos professores’ eram falsas”, diz.
A ironia não escapou aos banqueiros presentes. “Nós fizemos enormes bobagens em matéria de política monetária”, explicou Stephen Roach, presidente do Morgan Stanley na Ásia, criticando o banco central norte-americano, o Fed, por ter levado o país a uma “orgia de consumo”.
A “orgia” em questão diz respeito a uma ínfima minoria da população. Enquanto o 1% mais rico dos norte-americanos divide um quinto dos rendimentos do país – um recorde histórico –, o salário médio quase estagnou entre 2000 e 2007, subindo apenas 0,1%. Assim, o problema não foi tanto o alto consumo, mas a remuneração em baixa, que obrigou as pessoas a fazer empréstimos para morar, educar os filhos ou cuidar da saúde – as tarifas dos seguros de saúde, por exemplo, subiram 68% durante o mesmo período. Além disso, os detentores das grandes fortunas optaram por investir em outros lugares, em detrimento do potencial industrial, aumentando as importações e gerando déficits.
E foram os mais pobres que pagaram essa conta2. Assim, em vez de os capitais saírem do norte rumo aos países do sul, movimentação que ocorreu até meados dos anos 1980, eles fizeram o caminho inverso: são principalmente as nações emergentes que estão cobrindo os déficits norte-americanos ao comprarem títulos do Tesouro americano. Entre 80% e 90% das compras são feitas pelo estrangeiro. O Japão, muito desenvolvido, continua sendo o mais fiel comprador, tendo investido US$ 1,2 trilhões3. Mas Pequim está logo atrás, na segunda posição, com US$ 922 bilhões.
A China não é mais somente “a fábrica do mundo”, ela tornou-se o banqueiro dos Estados Unidos. E se levarmos em consideração as outras potências da região – Hong Kong, Coréia do Sul e Cingapura –, concluiremos que a Ásia absorve mais da metade da dívida pública norte-americana acumulada no estrangeiro.
A essa lista se somam ainda os países exportadores de petróleo, grandes provedores de fundos – ainda que duas vezes menos que os chineses –, além de nações emergentes como o México e o Brasil. Até a Rússia, tão desacreditada pelo presidente Bush, figura entre os 20 mais importantes compradores dos bônus do Tesouro americano, o que mostra que é possível trocar declarações vingativas e, ao mesmo tempo, abrir largamente a gaveta do caixa.
Imagine a comoção de Wall Street se a China reduzisse seus financiamentos ou freasse as compras de títulos do Tesouro. Ainda bem que esse não é o estado de espírito das autoridades de Pequim.
“Nós devemos nos unir”, explicou o primeiro-ministro chinês Wen Jiabao, em entrevista à revista norte-americana Newsweek. “Nestes tempos tão difíceis, a China se une aos Estados Unidos. E pensamos que esse ato de dar as mãos deve ajudar a estabilizar a economia e as finanças mundiais, impedindo um caos maior. Acredito que a cooperação é indispensável4”, precisou.
Podemos ver aí a prova de uma aliança ideológica entre adeptos do capitalismo. Mas, ao que tudo indica, Pequim quer mesmo defender seus interesses. “Se o setor financeiro norte-americano vai mal, nós nos inquietamos com a segurança dos capitais chineses”, assegura o primeiro-ministro.
E isso é apenas a ponta do iceberg. Pequim possui a maior reserva mundial de dólares, estimada em US$ 2 trilhões5. Isso representa mais de dois terços da produção chinesa anual. Se um tsunami arrasar o sistema financeiro norte-americano, levando na tormenta as notas verdinhas, o pote de ouro chinês murchará como um balão. Esse é um dos motivos que impede Pequim de simplesmente ignorar os títulos do Tesouro no mercado ou diminuir espetacularmente suas reservas de câmbio em dólares. Qualquer queda da moeda americana provocaria uma alta do iene e, acima de tudo, conduziria a uma desvalorização das reservas da China. Eis o que pode acalmar muito os ardores.
Na verdade, os Estados Unidos não podem mais abrir mão dos financiamentos da China e Pequim também não pode se desvincular da sorte do gigante norte-americano. O que também vale para Tóquio, que possui a segunda maior reserva em dólares do mundo, e mesmo para a Rússia, que está em terceiro lugar.
O inconveniente papel do dólar nos câmbios mundiais é herança da Segunda Guerra Mundial. Na época, os Estados Unidos foram os únicos a sair do conflito mais ricos do que entraram. A Inglaterra, endividada, estava enfraquecida. A França, sem fôlego. A União Soviética, exangue.
Os acordos de Bretton Woods – nome da cidade de New Hampshire onde foram definidas as novas regras financeiras, em julho de 1944 – consagraram essa potência. Afirmaram o papel central do dólar, que desbancou a libra esterlina. Criaram as duas instituições que se tornaram os braços armados de Washington: o Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento (Bird, futuro Banco Mundial) e o Fundo Monetário Internacional (FMI). O Plano Marshall, para a reconstrução da Europa no pós-guerra, foi financiado em dólares, o que consolidou o peso das cédulas verdes e assegurou mercados para os produtos norte-americanos.
Um dos célebres negociadores de então, o inglês John Maynard Keynes, propôs um sistema monetário fundado em uma nova moeda realmente internacional, o bancor6. Mas a correlação de forças não permitiu. O dólar se impôs e, com ele, a hegemonia dos Estados Unidos sobre o mundo ocidental.
Isso permitiu aos dirigentes norte-americanos fazer tudo o que quisessem, deixando sua conta para os outros pagarem. Quando a situação se tornava difícil, eles mudavam unilateralmente as regras do jogo.
Uma célebre expressão do secretário norte-americano do Tesouro, John Connally, resume bem esse pensamento: “O dólar é nossa moeda, mas é seu problema”.
Em 15 de agosto de 1971 o presidente Richard Nixon decretou que a moeda norte-americana não seria mais conversível em ouro. Ela não seria nada além de papel, flutuando ao sabor dos mercados e das políticas norte-americanas.
“O privilégio exorbitante do dólar”, denunciado desde os anos 1960 pelo então presidente francês, o general Charles de Gaulle, se aprofundava. Os governos se submeteram. Mantiveram suas transações comerciais em dólar e permitiram que os bancos centrais armazenassem a moeda, ao lado de marcos, ienes e depois do euro.
Ainda hoje o sistema-dólar domina o mundo. Os Estados Unidos podem acumular dívidas e impor que elas sejam quitadas por seus “parceiros”, como podem atrair capitais para seu território – para a indústria, a pesquisa ou para socorrer empresas – e em seguida exportá-los, facilitando as implantações de suas multinacionais no estrangeiro.
Se tomarmos o conjunto do Investimento Direto Estrangeiro (IDE) realizado no mundo em 2007, os Estados Unidos continuam sendo os primeiros beneficiários, além de serem os maiores investidores no estrangeiro7. Dessa forma, os americanos gozam de um poder excepcional de seleção geopolítica dos capitais.
Mas esse sistema não tem uma base totalmente sólida. Os países que acumularam reservas não se contentam mais em colocar o dinheiro em bancos, como haviam feito as nações exportadoras de petróleo nos anos 1970. Eles criaram os chamados “fundos soberanos”, com pelo menos US$ 4 trilhões destinados a resgatar empresas estrangeiras ou investir em projetos de desenvolvimento – alguns deles faraônicos, como nos países do Golfo8. Trata-se de uma nova arma de intervenção, temida pelas nações mais ricas.
Além disso, o peso do dólar nas reservas de câmbio mundiais baixou perto de dez pontos em menos de dez anos: ele representava 62,4% das divisas detidas pelos bancos centrais no fim do primeiro semestre de 2008, contra 71,2% em 2000.
Durante o mesmo período, a participação do euro passou de 18,3% a 27%9. Símbolo da potência japonesa dos anos 1970-1990 o iene porém caiu, de 6,1% para 3,4%. No entanto, nem o euro nem o iene estão em condições de tomar o lugar do dólar.
Somente uma potência econômica consolidada e uma visão política original forte pode fazer balançar o sistema, ou, pelo menos, permitir um tratamento de igual para igual.
A União Européia, que mergulhou nas delícias da desregulamentação à moda norte-americana, não pode esperar vencer esse desafio. Os especialistas mais bem-intencionados estimam um crescimento médio próximo de zero para o ano que vem. Ou seja, um crescimento exponencial do desemprego e das falências de empresas. No plano político, o Velho Continente continua inexistente e, ao contrário do que dizem as fábulas midiáticas, permaneceu “fora de combate” na crise.
Alguns de seus princípios, apresentados como intangíveis, foram ignorados. Os europeus deram adeus aos critérios de Maastricht, que deveriam limitar os déficits públicos, e, agora com a crise, cada Estado adotou, de forma semelhante, o plano de nacionalização bancária definido originalmente pelo primeiro-ministro trabalhista britânico Gordon Brown, dirigente de um país que nem sequer é membro da zona do euro!
“Ainda não chegou o tempo da China estar em pé de igualdade com os Estados Unidos, mas a relativa mudança do centro de gravidade deve lhe dar confiança10”, observa Dingli Shen, diretor do Instituto de Estudos Internacionais da Universidade Fudan, em Xangai.
Terceira potência econômica mundial, muito inserida no mercado financeiro, a China evidentemente não está protegida de turbulências. Seus economistas já estimam que “todos os grandes investimentos realizados off shore [fora da China] no ano passado estão no vermelho11”. Suas participações nos bancos Morgan Stanley (US$ 5 bilhões) e Blackstone (US$ 3 bilhões), que simbolizaram a irrupção chinesa nos negócios mundiais, foram pesadamente desvalorizadas.
Esses acontecimentos levaram a um intenso debate sobre a legitimidade dessa política no núcleo dirigente do Partido Comunista e na internet. Coerente com este questionamento, o governo chinês recusou-se a socorrer o banco norte-americano Lehman Brothers. Tudo para que os aportes chineses não sejam considerados “depositários de ativos duvidosos (dump money)” nem sleeping partners (que não têm direito de intervenção), explica um integrante do setor bancário. No caso do Morgan Stanley, o seu resgate pelo banco japonês Mitsubishi JC assegura aos japoneses um assento no conselho administrativo.Nesses últimos tempos, em Pequim, tem-se ouvido uma história muito bem resumida pelo Financial Times12. No início dos anos 2000, o primeiro-ministro Zhu Rongji reuniu todo um conjunto de economistas, funcionários e especialistas em finanças para descobrir novos instrumentos de investimentos mundiais. Estes lhe foram apresentados como “um espelho que se coloca em frente a outro espelho e assim sucessivamente até o infinito”. É realmente uma definição muito boa daquilo que se chama de “derivativos financeiros” (produtos da especulação que servem para a especulação), cujos estoques em escala planetária ultrapassam hoje US$ 1 quatrilhão, um valor apoiado apenas no virtual e que equivale a 20 anos de produção mundial. Convencido de que “não devemos nos satisfazer com coisas que não compreendemos”, como manda o velho ditado chinês, Zhu não escancarou as torneiras. Seus sucessores tampouco.
Ainda que não saibamos as dimensões da crise mundial, as participações dos bancos chineses nesse tipo de investimento parecem limitadas, diz um economista do Banco Industrial e Comercial da China (ICBC).
A recente decisão de autorizar as vendas a prazo nas bolsas chinesas parece andar outra vez na contra-mão, enquanto alguns países ocidentais limitaram seu uso por causa da espiral especulativa. Ainda assim, globalmente a China manteve barreiras protetoras. Segundo o professor Yang Baoyun, da Escola de Estudos Internacionais da Universidade de Pequim, “o sistema financeiro permanece sob controle”.
Apesar das pressões internacionais, Pequim possui um setor bancário largamente nacionalizado e mantém o domínio dos câmbios, assim como uma gestão prudente de sua moeda13.
Ironia da história, o FMI preparou, para outubro, um documento contra essas regulamentações, que já foi devidamente arquivado, esperando por dias melhores. “O desequilíbrio da China [acusada de manipular sua moeda para baixo e de não desregulamentar suas finanças] é um problema de longo prazo e pode esperar um mês”, comentou Dominique Strauss-Kahn, que visivelmente não percebeu o ridículo da discussão14.
Pequim não somente conservou instrumentos de intervenção pública, mas seu crescimento tem como base a produção e a pesquisa. De fato, a crise sistêmica que atinge os Estados Unidos e os países europeus demonstra que não se pode separar, de maneira duradoura, os serviços e as finanças da produção material. O modelo de desenvolvimento chinês é puxado pela exportação. A previsível queda do consumo de dois de seus principais clientes – os Estados Unidos e os países da União Européia – traz o risco de acarretar uma baixa das vendas e, conseqüentemente, dos volumes produzidos15.
Mas apesar da crise dos países desenvolvidos, a China tem assegurado outros mercados e ainda mantém sua progressão: no início de 2008, 60% de suas trocas comerciais se realizavam com outros países asiáticos.
É evidente que estes últimos também não estão a salvo de uma desaceleração – o Japão está à beira da recessão, a Coréia do Sul passa por dificuldades e a Índia não está em melhor situação –, já que entre metade e dois terços desse comércio intra-asiático “desemboca nos mercados do G3 (Estados Unidos, União Européia e Japão)”, como afirma Sopanha Sa, economista da Société Générale. Se o fluxo de compra e venda mudar muito, as conseqüências serão imediatas.
Um editorial não assinado do oficialíssimo Jornal do Povo resume perfeitamente a situação: “O mito de Wall Street está desmoronando e o comércio mundial está diretamente ameaçado. As vantagens relativas do ‘made in China’, sobretudo a longo prazo, poderão se reduzir e a competitividade da China na exportação corre o risco de enfraquecer. A geopolítica mundial se tornará cada vez mais complexa, o neoprotecionismo chegará e, no futuro, as barreiras comerciais vão mais aumentar que diminuir”.
As autoridades chinesas estão conscientes de que uma nova fase começou e procuram outros modos de crescimento. O professor Yang vai direto ao ponto: “Não há outro meio que não seja desenvolver o mercado interno”. E principalmente reduzir as desigualdades entre a cidade e o campo.
A explosão do preço dos produtos alimentares permitiu aumentar a renda dos camponeses em 17,9% no primeiro semestre de 200816. Mas aumentar o poder de compra para impulsionar o consumo não é suficiente: hoje, uma parte do que é ganho vai para a poupança. As famílias guardam dinheiro para cuidar da saúde ou para garantir sua aposentadoria. Portanto, é necessário construir um sistema eficaz de seguridade social coletivo, ainda embrionário, e paralelamente aumentar a renda.
As molas internas do crescimento já começam a se movimentar. Dos 11,4% registrados em 2007, “4,4% vinham de despesas de consumo, 4,3% de investimentos e 2,7% de exportação líquida”, explica Li Xiaochao, do Escritório Nacional de Estatísticas.
A tendência de crescimento deveria continuar este ano a uma taxa de 10%. Para 2009, no entanto, os especialistas calculam um crescimento em torno de 7% a 8%, o que seria o sonho de qualquer dirigente ocidental. Mas levando em conta os desafios internos a superar – pobreza, descontentamento dos camponeses, fragilidade política das classes médias – diminuir dois ou três pontos percentuais assinalaria, sem dúvida, o começo dos problemas. Além disso, um novo modo de crescimento, mais cuidadoso com o meio ambiente, se torna cada vez mais essencial.
Novas instituições locais
No exterior, a China busca afrouxar a pressão do dólar. Ela aplicou uma parte dos excedentes na África sem as condições outrora impostas pelo Banco Mundial e o FMI. Além disso, multiplicou os acordos comerciais bilaterais com Venezuela, Rússia, Iraque e Irã, para assegurar seu aprovisionamento energético; e com Japão e Índia, para garantir novos mercados. Apoiou ainda a criação do Fundo Monetário Asiático, lançado em maio de 2007 com os vizinhos japoneses e sul-coreanos. Dotado de US$ 80 bilhões, esse fundo garante solidariedade financeira entre os dez países da Associação das Nações do Sudeste Asiático, sem passar pelo FMI, que tem um passado aterrorizante na região.
Iniciativas similares são tomadas em outras regiões do mundo, todas para se emancipar do dólar. Na América Latina, o Banco do Sul, que reúne Argentina, Bolívia, Brasil, Equador, Paraguai, Uruguai e Venezuela, tem por objetivo ajudar no financiamento de infra-estrutura de seus membros, por fora das instâncias de Bretton Woods. A Argentina e o Brasil também decidiram pagar suas compras recíprocas em moedas locais, riscando a cédula verde de suas trocas comerciais.
Ligações quase institucionais se estreitam entre o chamado BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China). A Rússia se consolida na Europa, e não somente porque dispõe de matérias-primas. O Brasil ganha relevância na América Latina, ainda que se arrisque a sofrer com a recessão norte-americana. O comércio sul-sul se desenvolve a todo vapor.
Estamos ainda longe de uma frente unida capaz de impor novas regras internacionais que destronariam o dólar e seus suportes institucionais, o FMI e o Banco Mundial. Mas já se delineiam previsões, como a do professor Arvind Subramanian, que, no Financial Times, imagina a China emprestando fundos aos Estados Unidos sob o modelo das “condições” outrora impostas pelo FMI: os critérios seriam, dessa vez, públicos (controle dos bancos) e sociais (criação de “redes de seguridade social”). A China, escreve ele, “se colocará em posição de superpotência”. Por ora, Pequim não tem disposição nem meios para isso. Mas e amanhã?
*Martine Bulard é redatora-chefe adjunta de Le Monde Diplomatique (França).